Revista Brasileira de Gestao Ambiental e Sustentabilidade (ISSN 2359-1412)
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Vol. 9, No 23, p. 1299-1316 - 31 dez. 2022

 

Local ecological knowledge of rural women living in the buffer zone of a conservation unit in Brazil



Waldiléia Ferreira de Melo Batista Ian Gabriel de Melo Batista Igor Ramon de Melo Batista Reinaldo Farias Paiva de Lucena e Roseli Farias Melo de Barros

Abstract
Conservation Units are recognized worldwide as the best strategy to promote the protection of biodiversity. The local ecological knowledge of women who live in the surroundings of these spaces can be used to record the cumulative sets of knowledge passed down through generations by cultural transmission. The objectives of this study were to identify the wild tree/shrub species of the useful flora known/used in each cultural domain, verify the existence of cultural consensus in each domain indicated, and verify the similarity between species in the cultural domains. Forty interviews were conducted with residents of three communities located in the buffer zone of the Sete Cidades National Park using semi-structured forms and the free list method. Sixty six species belonging to 24 families and 62 genera were recorded, and the existence of three cultural domains was identified: health (36 species), nutrition (35 species), and timber (34 species). Cultural consensus was observed for the three domains. There was a low similarity between the mentioned species in the domains, indicating high versatility. The knowledge of the women about wild vegetation reaffirms their autonomy in different aspects, especially in the family's health care and food security and sovereignty in these rural populations. It can also contribute to the elaboration of public policies aimed at the conservation of ecological and cultural biodiversity.


Keywords
Cultural consensus; Cultural domain; Ethnobotany; Women.

Resumo
Conhecimento ecológico local de mulheres rurais residentes na zona de amortecimento de uma unidade de conservação no Brasil. As unidades de conservação são reconhecidas mundialmente como a melhor estratégia para promover a proteção da biodiversidade. O conhecimento ecológico local das mulheres que vivem no entorno desses espaços pode ser usado para registrar os conjuntos cumulativos de saberes transmitidos de geração em geração por transmissão cultural. Os objetivos deste estudo foram identificar as espécies arbóreas/arbustivas silvestres da flora útil conhecidas/utilizadas em cada domínio cultural, verificar a existência de consenso cultural em cada domínio indicado e verificar a semelhança entre espécies nos domínios culturais. Foram realizadas 40 entrevistas com moradores de três comunidades localizadas na zona de amortecimento do Parque Nacional das Sete Cidades utilizando formulários semiestruturados e o método de lista livre. Foram registradas 66 espécies pertencentes a 24 famílias e 62 gêneros, e identificada a existência de três domínios culturais: saúde (36 espécies), nutrição (35 espécies) e madeireira (34 espécies). O consenso cultural foi observado para os três domínios. Houve baixa similaridade entre as espécies citadas nos domínios, indicando alta versatilidade. O conhecimento das mulheres sobre a vegetação silvestre reafirma sua autonomia em diversos aspectos, principalmente na atenção à saúde da família e na segurança e soberania alimentar dessas populações rurais. Também pode contribuir para a elaboração de políticas públicas voltadas à conservação da biodiversidade ecológica e cultural.


Palavras-chave
Consenso cultural; Domínio cultural; Etnobotânica; Mulheres.

DOI
10.21438/rbgas(2022)092311

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